Foi só em 1996 que o 20 de setembro passou a ser feriado. Antes, ninguém dava muita bola para o dia da Revolução Farroupilha. O fato é que, a cada ano, ele fica mais popular. Trata-se obviamente de uma construção cultural, assim como foi a retomada da figura do gaúcho nos anos 40 em um novo patamar, agora heroico. Mas você se engana se acha que vai encontrar aqui a crítica surrada ao Movimento Tradicionalista Gaúcho. Primeiro, porque nunca vi problema nenhum no baile à fantasia promovido por Paixão Cortes e sua turma – e que logrou um êxito impressionante ao longo das últimas décadas.
Jamais montei num cavalo, mas acho até mesmo saudável a existência dessa construção cultural, imaginário ao qual lugares de povoação relativamente recente, como o RS, precisam se apegar. Toda parte alegórica de uma tradição é uma construção relativamente forçada, seja no RS, na Europa ou na China (ainda que os hábitos, menos perceptíveis, sejam autênticos). É preciso construir uma tradição, enfim. Siga-a quem quiser. Segundo motivo: porque em geral a crítica ao MTG surge de um pensamento autoritário típico da esquerda jurássica, que no Rio Grande do Sul tem uma sobrevida inexplicável. Em geral, mistura alhos com bugalhos em sua argumentação, tentando desconstruir os mitos da Revolução – como se isso fosse necessário. Falham justamente porque batem em mitos que, por sua condição de mitos, terão sempre seus defeitos perdoados por quem decidiu ser um fiel e cego seguidor (ou não é, mais ou menos, o que acontece com o inimputável ex-presidente Lula?). O motivo da cruzada é o mesmo de sempre: trata-se de um nicho da sociedade do qual a esquerda não faz parte ou entre o qual não tem predomínio. No pensamento autoritário que a caracteriza, o que escapa ao seu domínio deve ser eliminado. Na impossibilidade deste, desmoralizado. Então eles tentam.
Feita a ressalva, retorno ao recente “sucesso” do feriado Farroupilha, que nos últimos anos virou talvez o mais importante feriado do Rio Grande do Sul. Mesmo eu estando longe, é impossível não perceber como o ufanismo gaúcho recrudesceu. Principalmente em função do mercado publicitário, que se deu conta do filão e dele se aproveita legitimamente. Seja para vender cerveja ou para vender jornal, funciona. E acaba até mesmo conferindo um caráter engraçado e simpático ao tal ufanismo, tornando-o menos ridículo. Afinal, nada mais eficiente para espantar o espectro do nacionalismo burro do que saber rir de si mesmo.
Há, no entanto, um outro lado na questão – e é aqui que eu gostaria de chegar.